Habitação de Interesse Sustentável

sustentabilidade: da arquitetura ao espaço urbano

este projeto parte da premissa que a aplicação do conceito de sustentabilidade em habitação de interesse social precisa considerar suas múltiplas dimensões (ambiental, social, econômica e cultural) e escalas (do ambiente individual e familiar ao espaço coletivo): da arquitetura ao espaço urbano.

dessa premissa, resultaram as seguintes estratégias de projeto:

sobre as unidades e sua relação com o conjunto

conforto, eficiência, acessibilidade e conectividade urbana

manter o número de unidades de habitação no mínimo exigido no TR (70 unidades), a fim de permitir: unidades com maior área para garantir níveis desejados de acessibilidade, conforto e eficiência; inserção de espaços de uso coletivo no térreo e a conexão urbana do conjunto. promover o conceito de ruas e espaços ativos, com espaços permeáveis e diversidade de usos.

prioridade para as pessoas

manter os estacionamentos nas bordas do terreno, a fim de promover a apropriação dos espaços pelas pessoas, com pátios internos conectados à vizinhança, pequenas praças, espaços lúdicos, hortas comunitárias, estacionamentos para bicicletas e caminhos sombreados.

diversidade tipológica e compacidade

a diversidade tipológica, proposta no TR, foi incorporada ao projeto de maneira a também promover diversidade espacial e de escalas e evitar espaços monótonos e ermos. a compacidade do conjunto também facilita a construção e reduz os custos .

calçadas verticais: circulação horizontal como espaço de convivência

a cultura da cadeira na calçada, no final da tarde, é reinterpretada neste projeto a partir do conceito de calçadas verticais. a circulação horizontal é dimensionada não apenas para atender as demandas mínimas de deslocamento e segurança, mas também para possibilitar a apropriação coletiva. as circulações são sempre abertas às ruas ou aos pátios e permitem a interação comunitária e a conectividade visual entre as unidades de moradia e o entorno.

coberturas ativas

a cobertura, neste projeto, cumpre não apenas a função de abrigo, mas também de espaço potencial para a vida comunitária e práticas sustentáveis. trata-se do conceito de coberturas ativas, com espaços para a instalação de hortas comunitárias, espaços de convivência, infraestrutura de painéis solares e aquecimento de água.

sobre as unidades e seus elementos espaciais e construtivos

nível A em eficiência energética

as unidades habitacionais foram projetadas de maneira a alcançar o nível A em eficiência energética, a partir das seguintes estratégias:

não implantar áreas de permanência prolongadas com orientação oeste;

priorizar as orientações mais favoráveis;

sempre utilizar elementos de sombreamento (passivos e ativos), adaptáveis conforme a orientação e a zona bioclimática;

recuo de aberturas em relação às fachadas, a fim de criar sombreamentos;

aberturas dimensionadas e localizadas de maneira a permitir a desejada iluminação natural e ventilação cruzada, combinadas à proteção solar passiva e ativa;

utilização dos espaços de circulação como elementos de proteção, sombreamento e amortecimento para as áreas de permanência não prolongada situadas nas orientações menos favoráveis;

soluções de envoltória que combinam alto nível de eficiência energética, economia e baixo custo de manutenção.

sistema construtivo industrializado e modulado

a estrutura é composta, principalmente, por componentes pré-fabricados em concreto armado, que permitem: redução do custo; processo construtivo otimizado; minimização de resíduos; boa inércia térmica; durabilidade; baixo custo de manutenção e adequação às diversas zonas bioclimáticas.

a opção por estruturas em concreto também se justifica pelo alto custo de manutenção de estruturas em aço e pelas restrições de uso de estruturas metálicas em regiões litorâneas ou em ambientes agressivos a esse material, conforme Anexo II da Portaria 660/2018 do Ministério das Cidades (característica de grande parte dos município situados na Zona Bioclimática 8).

o módulo estrutural básico é definido por pórticos de pilares e vigas pré-moldados com vãos de 9 metros, espaçados a cada 6,60m.

a laje de piso e cobertura, também responsável pelo travamento do módulo estrutural, é composta por painéis alveolares pré-moldados.

os quatro núcleos de circulação serão executados em concreto armado moldado in-loco, a fim de conferir estabilidade e travamento ao conjunto de unidades executadas em componentes pré-moldados.

flexibilidade e adaptabilidade

a solução estrutural adotada e a concentração das instalações em parede hidráulica ao longo da circulação permitem total flexibilidade da compartimentação das unidades. as alvenarias não cumprem função estrutural e podem ser retiradas, acrescentadas ou deslocadas conforme a demanda familiar.

racionalidade das instalações

as unidades foram todas configuradas de maneira a manter as “áreas molhadas” (cozinha, área de serviço e banheiro) ao longo de “parede hidráulica” ao longo da circulação externa, a fim de facilitar o encaminhamento horizontal e vertical das instalações e permitir a flexibilidade dos demais compartimentos.

em cada unidade há shafts para encaminhamento vertical das instalações hidrossanitárias e elétricas, acessíveis pela circulação horizontal. nesses espaços também serão instalados medidores individualizados de água e energia.

a fim de reduzir custos e facilitar a manutenção, o encaminhamento horizontal das instalações ocorre ao longo da circulação e no sentido vertical pelos shafts das unidades de habitação e dos núcleos de circulação vertical.

sistemas sustentáveis

as lajes de cobertura dos blocos de quatro pavimentos receberão placas solares fotovoltaicas para geração de energia e sistemas de aquecimento de água, com placas e reservatórios.

estão previstos sistemas de filtro, reservatórios e bombas para reaproveitamento das águas pluviais que são captadas nas coberturas e utilizadas na irrigação das hortas comunitárias e jardins. o objetivo é reduzir o consumo de água potável e minimizar o impacto das águas pluviais nas redes públicas.

parte dos efluentes do sistema de esgoto das unidades sanitárias será tratada nos canteiros verdes e hortas comunitárias dos canteiros e do pátio situados no térreo,utilizados como “leitos de evapotranspiração” (LETIs). apenas a parcela excedente é encaminhada à rede pública.

estratégias para redução de custos de construção e manutenção

o conjunto de soluções utilizadas na tipologia (modulação); no sistema construtivo (modulação, racionalização e componentes pré-moldados); nas instalações aparentes e racionalizadas; acabamentos simples e resistentes (blocos aparentes em concreto e estrutura aparente) permitiu a redução dos custos de construção e de manutenção, e a estimativa de custo médio por UH inferior a R$ 110.000,00 (não incluídas as unidades comerciais).

adaptabilidade a diferentes zonas bioclimáticas, orientações e topografias

a lógica de configuração das unidades e as possibilidades de combinação tipológica permitem ajustar a implantação às diversas situações topográficas e orientação desejável, conforme a zona bioclimática e condições locais.

os exemplos a seguir ilustram algumas situações, que seguem sempre as seguinte premissas: (a) promover a diversidade tipológica; (b) ajustar à topografia; (c) gerar permeabilidade do lote e relação com a rua; (d) evitar ambientes de permanência prolongada para o oeste; (e) priorizar a orientação leste ou sul para a zona bioclimática 8; (f) priorizar a orientação leste ou norte para a zona bioclimática 3; (g) utilizar os elementos de circulação como barreiras de amortecimento, nas orientações indesejáveis.

avaliação do projeto . eficiência energética

Para a aplicação na ferramenta de avaliação de projetos, foram consideradas as unidades de 2 quartos (em maior número no empreendimento), com orientação das áreas de permanência prolongada para o leste.

O resultado foi o nível A de eficiência energética tanto na zona bioclimática 8 (ZB8) quanto na zona bioclimática 3 (ZB3).

O único ajuste necessário de uma zona bioclimática a outra é a composição da parede: inclusão de camada de EPS no vazio entre os blocos de concreto e argamassa interna de 2,5 cm, para a ZB3. As demais soluções de envoltória, aberturas e cobertura são as mesmas para as duas zonas.


gsr arquitetos

autores: elcio gomes, fabiano sobreira e paulo ribeiro

colaboradores: luana alves, luísa porfírio, maria schulz e mariana albuquerque

concurso nacional de arquitetura . 2021 . segundo lugar